Divã da Autora - EP #4



Anjinhos da titia, que saudades! 

Foi um grande hiato o dessa coluna não, foi? Estive de mudança nos últimos tempos, mas agora que a estabilidade começou a se instalar, eis-me aqui com o computador ligado na rack da sala, cheia de ansiedade para continuar nossas conversas. 

E o assunto hoje é: evolução

Quem persiste no caminho da escrita está cansado de saber, o autor que fomos ontem não é o autor que somos hoje. O tempo e o esforço trata de nos aperfeiçoar, lapidar nossas habilidades e de tempos em tempos é bom olhar para trás e ver o quanto nossa escrita mudou.

É isso o que vim dividir com vocês hoje. Aqui vai uma breve análise dos erros que cometi em minha primeira fanfic que atualmente está em reedição e repostagem. Espero que inspire e acrescente. 

*

A bendita da ortografia

Minha primeira fanfic foi escrita 3 anos depois do fim do meu ensino médio, ou seja, 3 anos depois que eu peguei num livro de língua portuguesa pela última vez. 

Na época, eu ainda não era redatora freelancer, revisora muito menos e vivia um período um tanto quanto conturbado de transições em minha vida pessoal. 

A língua portuguesa possui inúmeras regras, muitas carregam exceções particulares e se mesmo para aqueles que passam a vida estudando isso, é quase impossível ter tudo decorado, imaginem só para alguém distante do assunto por tanto tempo. 

Apesar de sempre ter tido a escrita e a leitura próximas no meu dia a dia, a verdade é que nosso sistema educacional tende a se preocupar mais em nos fazer passar nos exames do que de fato aprender, absorver e manter fresco na memória para que executemos o conhecimento com louvor no cotidiano. 

Acreditem se quiserem, eu fui uma das melhores alunas de língua portuguesa ao longo de todos os meus anos letivos, não tem uma mancha vermelha sobre isso nos meus históricos e ainda assim, lá estava eu em 2016, cometendo erros básicos.

Na maioria das vezes, eu me lembro de só reconhecer que possuía alguma dúvida, no meio do texto, quando eu empacava sem a certeza de se o que digitaria estaria correto. 

É claro, não estou dizendo que para postar uma fanfic se precisa de uma coleção de diplomas ou de uma cadeira na ABL, mas uma noção básica junto de um esforço mínimo ― e contínuo ― de pesquisa e revisão ajudam muito. Afinal, nosso lado leitor bem sabe o quanto a qualidade do texto influencia na nossa imersão e sentimento pela história.    

E meus principais erros ortográficos foram:

Eu exagerava nas reticências;

Quero dizer, eu não sabia exatamente em quais casos se adequavam as reticências e tenho plena certeza de que esse detalhe escapou das minhas aulas de português. 

As reticências marcam uma suspensão na melodia da frase. Elas deixam em aberto ideias e ações, ajudam a transmitir sentimentos da linguagem falada para a escrita, dentre tantos outros usos muito úteis aos escritores (recomendo esse post respeito, é bem didático). Eu até que não errei demais quanto aos usos, o problema é que o uso em excesso fazia a minha escrita parecer... Digamos assim, preguiçosa.

Vocês que acompanham meus textos por aqui, podem achar que eu ainda as uso muito, mas acreditem em mim, antes era demais! 

Uma análise mais profunda me mostrou que a maioria das minhas reticências podiam ser substituídas por diálogos mais enfáticos e condizentes com a personalidades dos personagens ― afinal, numa sala com cinco pessoas, nem todo mundo é reticente ― além de descrições melhores sobre o clima da cena. 

Se é explícito que aquela é uma cena, por exemplo, triste, qual a necessidade de um excesso de reticência para transmitir esse sentimento?

Eu errava o lugar das vírgulas;

Um dos sinais de pontuação mais usado, sem dúvidas. E eu, como muita gente, imagino, lidava com ela como se eu apenas tivesse que salpicá-la pelo texto onde quisesse marcar uma pausa mais curta do que um ponto final ou ponto parágrafo. 

No fim, eu estava usando vírgulas como se usa reticências e basicamente tentando forçar um drama desnecessário com elas. 

A verdade é que a vírgula não só serve para muito mais do que marcar pausas, como nem sempre que há uma pausa na fala ou numa leitura, existe a necessidade da vírgula. 

A grande essência da vírgula é organizar a frase, ela separa os elementos e determina suas funções dentro da oração. Sabe aquela piada de que uma vírgula errada pode “matar” alguém por mudar todo o sentido da frase? Pois quer dizer que é ela quem constrói o sentido do texto e como ele será interpretado. Poderosa, não é? Imaginem a agressão que eu não cometi nos meus primeiros capítulos por causa dela...  

Como esse é um assunto muito extenso e meus estudos a respeito vieram mais de livros e cursos, fico devendo um bom link a vocês, mas fiquem à vontade para abrir uma nova aba depois desse artigo e mandarem ver nas pesquisas, pelo menos dos usos principais.  

Excesso de “mas”

Não, não é o caso daquela dica calejada de “procure inserir sinônimos como, porém, entretanto, todavia, contudo, etc”. Sim, sinônimos ajudam muitas vezes, só que o caso aqui é o sentido do termo em si. 

Revisando hoje em dia, percebi que se a palavra fosse simplesmente retirada da frase ela não faria a menor diferença. Ela estava pesando ali, criando uma ligação forçada entre as frases do parágrafo que matava a fluidez do texto. 

Isso era fruto da insegurança que eu tinha de ir direto ao ponto e até de usar a voz ativa, que na verdade é algo incrível para qualquer texto. Eu tendia a acreditar que os leitores não entenderiam se eu não mastigasse, o que é um crime tremendo. 

Nunca, nunca subestime o seu leitor ou o impeça de imaginar e concluir as coisas por conta própria. 

Excesso de rubrica

Eu tinha uma mania chata de rubricar todas as falas. Fica a dica que quando se é implícito quem está falando, seja por algo específico na linha de fala ou porque só existem duas pessoas na cena, não se deve rubricar. É chato e desnecessário, cai de novo no erro do subestimar o leitor e quebrar a fluidez do texto.

Até mesmo a rubrica de “como” o personagem diz, exige certo cuidado. Esse é um bom momento de lembrar da famosa dica “mostre, não conte”. 

O ideal é que o leitor veja os personagens mostrarem suas emoções por eles mesmos. Por exemplo: 

“― Por favor, não vá. ― Ela disse à beira das lágrimas.”

Que também poderia ser:

“― Por favor, não vá. ― Ela se forçou a engolir o nó em sua garganta e seus olhos ganharam um brilho úmido.”

Num exemplo eu te contei como a personagem estava e no outro eu te fiz visualizar e entender isso por conta própria.

Erros de execução no ponto de vista 

Minha primeira fanfic foi também minha primeira experiência com narrador em primeira pessoa — e onde eu me apaixonei por esse estilo. Mas esse é um pov que demanda atenção a duas coisas básicas: Construção de personagem (já que é preciso conhecer bem a mente e a personalidade cuja visão narra a história) e o limite de visão e conhecimento desse personagem. 

Sendo primeira pessoa, o narrador só pode descrever aquilo que viu, conhece ou experienciou pessoalmente. Claro que ele também pode dizer o que lhe contaram ou o que ele teoriza sobre algo, porém isso deve ficar claro. Ele não pode dizer como outra pessoa se sentiu ou o que levou outro personagem a tomar alguma atitude, se ele não tem esse conhecimento.

Por diversas vezes eu esquecia que o meu protagonista não podia saber tudo o que eu sabia sobre seus companheiros de enredo. 

Falta de planejamento

Um dos meus maiores erros, sem sombra de dúvidas, foi não fazer a menor ideia do que esperava para o fim da história. Eu sequer imaginava o meio, na verdade. Eu um belo dia escrevi um primeiro capítulo, quase como uma piada interna entre irmãs, num dia que acabou a luz aqui em casa. No fim achamos satisfatório. A luz voltou e eu postei. Simples assim. Eu não fazia a menor ideia do futuro do roteiro e escrevi um dia após o outro num grande freestyle. Isso mesmo, uma fanfic de improviso, um deixa a vida me levar que faria inveja no Zeca Pagodinho. 

Eu fazia uma ideia muito sentimental do que queria passar, muito rasa de conhecimentos técnicos de escrita criativa. Quando comecei a receber meus primeiros feedbacks, isso me guiou a continuar. Mas sem um planejamento para pôr controle no que fazia, isso me levou a escrever uma fanfic gigante (sério, 88 capítulos) e sem rumo eminente. Um grande Grey’s Anatomy fanfiqueiro (com todo o respeito a obra — que eu assisti inteira — e aos fã). 

Paixão na escrita é maravilhoso, corresponder aos leitores é incrível, mas saber o que está fazendo, porquê e como fará, é essencial para um resultado satisfatório.  

Repetição de nomes

Podemos achar o nome dos nossos personagens a coisa mais linda do mundo, mas a verdade é que não ficamos evocando o nome das pessoas toda a vez que falamos com elas. Soa forçado e inverossímil fazer isso em nossas linhas de diálogo, além de que tudo aquilo que se repete demais, perde a magia.

Eu definitivamente não tinha essa noção em 2016.  

*

A despeito de todas essas observações, finalizo dizendo que não me arrependo de ter começado naquele momento do jeitinho que foi e isso não é uma forma de desencorajamento para ninguém que esteja em seus primeiros passos ou pensando em se arriscar. 

Escrita é uma arte que aperfeiçoamos na prática. Ninguém começa perfeito e a perfeição talvez nem exista. Existe o presente e o melhor que podemos ser no dia de hoje. Comecem, se arrisquem, se divirtam, estudem e evoluam ao seu tempo. Se orgulhem da jornada de vocês mesmo que assim como eu também já possam escrever um post numerando seus erros. 

Enxergar tudo isso agora, não quer dizer que atingi um topo e nunca mais vou errar nada. Não existe topo. 

Reconhecer os erros mostra que aprendemos com eles e ter passado por isso mostra que tivemos coragem de começar. Não sejamos tão duros conosco mesmos. Queremos ser bons, mas não podemos esquecer de nos divertir. 

Espero que os meus erros tenham entretido e ajudado vocês a melhorarem suas próprias escritas. 

Conversem conosco, por aqui ou por nossas redes sociais (Twitter e Instagram). Me contem o que acharam e se querem ler sobre a análise de outros erros de percurso. 

Por hoje é só, até uma outra terça, pessoal o/

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