Como Lidar Com A Multi-Inspiração



Parece estranho, parece raro. Alguns de vocês devem ter rido como se fosse uma piada. Outros devem ter até mesmo achado o conceito um privilégio. 

É porque no ficdom ouvimos falar mais sobre bloqueio criativo ou sobre passar mais tempo plotando, planejando, criando capas, playlists e aesthetics do que escrevendo de fato.

Mas os casos de multi-inspiração não só existem como são mais comuns do que parecem.  

E como tudo o que é demais tem um lado negativo, hoje vamos dissertar e trocar umas dicas sobre como lidar com esse revés. 
Mas o que é a multi-inspiração?
Podemos definir esse conceito entre nós, como aquele momento em que você enfim tem inspiração e vontade para escrever, porém em todas as suas histórias — caso vocês sejam daqueles que tem mais de uma long ou shortfic em andamento simultâneo.

Ou como quando apesar de já ter um projeto longo em andamento, te bateu a inspiração para uma nova história e talvez mais de uma, com de quebra outros cinco plots de oneshots e tudo isso parece tão irresistível e irrefreável quanto uma loucura total, mas lá está você fazendo pesquisas para isso, antes que pudesse sequer tentar se controlar.  
De onde ela vem? Do que se alimenta?
E por que nunca aparece para acabar com o bloqueio criativo?
Infelizmente, não temos uma resposta única e invariável para essas questões. Cabe a cada um de nós, atentados por esse fenômeno, uma auto-análise das circunstâncias em que ele ocorre em nossas experiências individuais. 
Mas vou deixar aqui uma listinha humilde de fatores comuns. Vai que você se identifica com algum — ou alguns… 
  • Você está há muito tempo trabalhando num projeto só, já sabe ele de cor e salteado, a fase de planejamento acabou e só te resta sentar e escrever, o que você já está ficando um pouco cansado;
  • Você consumiu um conteúdo novo muito empolgante e diferente do projeto que vinha trabalhando;
  • Despencou em queda livre num fandom novo;
  • De repente diferentes histórias suas receberam feedback e seu coração gritou: “e se eu tentasse corresponder todo mundo?”;
  • Você plotou uma cena específica, mas ela não cabe no seu projeto atual;
  • Começaram a pipocar novos headcanons na sua bolha fanfiqueira;
  • Algumas partes da experiência do seu projeto principal têm te chateado e bateu aquela irresistível vontade de ter outras histórias como válvula de escape para esses momentos. 
Mas qual é o problema disso?
O problema é que ao se afastar do seu projeto principal ou fragmentar muito a sua atenção entre várias histórias diferentes, você perde uma coisa muito importante para a criação e desenvolvimento de uma obra: a imersão.
A imersão nos ajuda a sentir melhor os personagens, nos colocarmos no lugar deles e assim escrevê-los com mais profundidade e verossimilhança. A imersão no universo da história nos ajuda a deixá-lo mais consistente e palpável para o leitor. E tudo isso nos ajuda a ter mais prazer e velocidade na produção. 
Às vezes isso pode chegar ao extremo de acabarmos tendo um monte de histórias abandonadas em nossos perfis, sejam os grandes projetos principais que acabamos esfriando o tesão — com o perdão da palavra — de tanto variar atenção para outros cantos, sejam essas próprias histórias novas que vieram brotando aos montes nesse surto de multi-inspiração. 
Por termos começado essas histórias no calor do momento, a tendência é que digamos a nós mesmos que “vai ser uma coisa simples, não vai tomar muito tempo” e por isso não aprofundamos planejamento para essas obras novas. 
Só queremos nos render à vontade impulsiva de escrever o que está martelando em nossa cabeça, criar uma capinha e mostrar para todo mundo. 
Mas se não for uma oneshot, uma hora essa impulsividade vai cobrar o preço. Seja quando o tal calor do momento passar e nos virmos sem saber como continuar além das primeiras inspirações que tivemos, seja quando olharmos e bater o pensamento “acho que não devia ter postado assim, vontade de refazer”
O atraso na conclusão dos nossos projetos é também uma consequência possível. E isso por tabela, acaba desestimulando e de certa forma até queimando a nossa imagem com os leitores, que com a nossa demora acabam perdendo o gás vão se empolgar em outra freguesia. 
Sim, é claro que tem aqueles fiéis que você pode excluir e retomar a história anos depois que eles vão vir firmes, fortes e saudosos — experiência própria. Porém não há como negar que muitos acabam desistindo mesmo e nós que lutemos com as saudades. 
E agora?
Faz tempo desde a última vez que procurei por respostas para essa questão, confesso. Mas me lembro bem das respostas — poucas — que encontrei. 

Basicamente um resumo de “se controle, foque no que já está fazendo”

Cá entre nós, sabemos bem, na verdade não é tão fácil assim. As ideias e a inspiração nascem no campo dos pensamentos e controlar seus pensamentos talvez seja uma das tarefas mais complexas para o ser humano.  

Esse é um dilema tão recorrente em minha jornada de escritora que estou lidando com ele nesse exato momento. E ainda que não exista uma receita de bolo onde eu possa simplesmente chegar para vocês e proclamar que tenho a cura, posso ao menos compartilhar o que aprendi com os anos de experiências e como venho tentando driblar isso até aqui. 
Abençoadas sejam as oneshots!
Especialmente se você é daqueles que tem alguma velocidade na escrita, elas podem ser a salvação. 

Não tiram muito do seu tempo, nem são um grande desvio do projeto principal, podem ser benéficas em arejar sua mente do estresse de criar uma história longa e matar aquela vontade louca que bateu de repente de escrever algo específico. 

Além de alimentarem um pouco seus seguidores entre a espera dos capítulos de sua história longa.

Oneshots nada mais são que contos, ou seja, narrativas curtas de conflito único e poucos personagens. Pense se a sua ideia cabe nessa estrutura e se tiver um tempinho sobrando, manda ver, posta e sai correndo, seja feliz. 
Você não pode agregar essa ideia ao projeto atual?
Se não der caldo para as oneshots resolverem ou der caldo demais e fugir dessa estrutura, talvez a saída seja que as suas ideias novas possam servir de complemento para a sua história principal. 

Dê uma olhadinha no seu roteiro, abre o arquivo do seu outline, revise as fichas dos seus personagens, ou simplesmente pare para pensar — caso você seja daqueles sinistros que faz e armazena tudo isso só com a força da mente. Suas ideias encaixam e agregam profundidade real e necessária na história? 

Se sim, bingo, levante as mãos para o céu e agradeça, seus problemas acabaram. 

Mas analise a questão com cuidado. Não force para enfiar toda ideia nova em sua história principal, só para não ter de desviar a atenção dela. Não vale a pena quebrar a consistência do seu roteiro e a construção dos seus personagens por isso.  
Lista de despejo
A multi-inspiração te acerta com muita frequência e você é uma verdadeira tempestade de plots aleatórios? Bom, nesse caso, eu te recomendo seriamente que considere ter sempre em mãos e atualizada, uma lista de despejo. 

Seja no celular ou em papel, o importante é que seja a forma mais confortável para você e a mais fácil e rápida de acessar — afinal, a multi-inspiração não costuma ter a bondade de avisar quando vai chegar e tende a escolher as situações mais aleatórias e improváveis do mundo, por isso é importante estar sempre preparado.

A lista de despejo é onde você vai, como o próprio nome já diz, despejar todas as ideias que te vieram à mente, sem o compromisso imediato de organizá-las ou estruturá-las. O objetivo é mesmo apenas guardar para impedir que se perca. 

E as vezes isso basta para acalmar o nosso coraçãozinho multi-inspirado. Às vezes somos capazes de nos contentar em apenas saber que aquela ideia está segura e que podemos voltar ali para resgatá-la num momento mais propício. 

Mas se esse não for o caso… 
Deixe a ideia amadurecer 
Você bem que tentou recorrer as opções acima, mas nenhuma serviu e você continua a se pegar pensando na sua ideia nova — ou ideias. Ela toma espaço na sua mente sem prévio aviso, na hora da louça, na hora do banho e não importa o que você faça, tudo parece só trazer mais força para ela. 

Ok, muita calma nessa hora. De fato, como já citamos acima, tentar controlar os pensamentos ou se impedir de pensar sobre alguma coisa é complicadíssimo e pessoalmente falando, eu nunca conheci alguém que tenha obtido pleno sucesso nisso. 

Nesse caso o que eu costumo fazer é aproveitar o inevitável. 

Já que a inspiração se recusa a me deixar em paz, eu tento me acalmar e só assisti-la se desenvolver. Eu paro de recriminar minha mente por ter plotado aquilo no momento errado e me sento de pernas cruzadas no meu salão dos pensamentos. Só observo, só escuto enquanto meu cérebro desata a falar tudo o que quer a respeito. 

E deixo os dias passarem. Com frequência eu percebo que muitas dessas super ideias não passam de coisas de momento e não tem real força para se sustentar e amadurecer. Depois de passado o fogo do instante em que elas nasceram, nem parecem mais tão boas e urgentes assim.
Crie metas ou reavalie as suas
No caso de você ter amadurecido a ideia e ainda assim ela parecer válida e a vontade de pôr a mão na massa estiver ficando cada vez mais difícil de segurar, então não tem jeito, talvez seja a hora de aceitar que ela te acertou de jeito. Tudo bem, acontece pelo menos uma vez na vida com qualquer artista. 

Mas você ainda não quer escantear seu projeto principal, nem fazer uma troca em sua atenção de trabalho. 

A solução que sobra é se acalmar, sentar e criar metas para os seus trabalhos ou readequar as que já existem. Não fique a contar com a sorte ou com achismos para depois se sentir frustrado. Tenha a visualização do panorama real dos seus projetos, calcule quanto tempo e atenção você pode destinar para cada um. 

Embarque nessa ciente dos desafios de lidar com mais de uma história ao mesmo tempo. Tome cuidado para não se sobrecarregar. Na hora de criar metas, tente fazer isso de forma a deixar sua rotina com espaço para cuidar de si e arejar a mente. 
Determine um dia ou horário para o novo projeto
Essa é uma dica muito pessoal, vista que tem base na minha própria rotina de escrita, mas vou deixar aqui para caso agrade alguém ou algum de vocês tenha um ritmo parecido. 

Eu determinei a mim mesma escrever todos os dias e sinceramente, são raros os dias em que furo essa regra. Escolhi para começar o horário das 18h, que bate com o fim das minhas demais tarefas e/ou com o desgaste da minha mente para lidar com elas, então eu já sento para escrever, louca pelo descanso dos jobs e dos estudos que isso me dá. 

Claro que em alguns dias em consigo trocar esse horário, começar mais cedo ou até mesmo acabo só conseguindo escrever por dez minutos, mas todo progresso é um progresso, afinal. Ah, e eu costumo me dar os finais de semana de folga, no entanto, como escrever é um prazer, vira e mexe lá estou eu fanficando. 

Sendo assim, quando a multi-inspiração me atinge e acabo tentando conciliar dois projetos, eu costumo deixar o secundário num ritmo mais lento e determino apenas um dia e horário da semana para lidar com ele, enquanto os demais seguem normais, focados na história principal. 

Costuma dar certo porque como a ideia acabou de nascer, ela não está cem por cento madura, então vou lapidando com cuidado, sem deixar nenhuma das duas de lado completamente. 
Autoanálise e autoconhecimento
Para que qualquer uma dessas ou de outras dicas a respeito que vocês encontrem por aí, são necessárias essas duas coisinhas. Do contrário nada feito, nada vai verdadeiramente funcionar.

Me arrisco a concluir dizendo que talvez a parte mais importante do aprendizado no caminho da escrita é esse. Conhecer a nós mesmos é o que permite uma análise racional e séria do porquê executamos nossa arte dessa ou daquela maneira. Em outras palavras, não adianta ter toda a técnica e disciplina no mundo e não saber quem você é quanto artista, porque vai se perder na hora da prática. 

O caminho do escritor exige que nos façamos perguntas o tempo todo e você precisa se conhecer para saber responder com honestidade.   

*

Isso acabou ficando um pouco mais longo do que eu esperava, confesso. Se você leu até aqui, meu muito obrigada pela atenção e espero que esse post tenha te acrescentado em algo. 

Agora conta para a gente, você já passou por isso? Tem alguma tática que não citei aqui no post? 

Divide conosco e compartilhe esse texto com seus parceiros escritores, vai que eles também são tão atormentados pela multi-inspiração quanto eu. 

Beijos de luz e até a próxima terça o/   

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